sábado, 20 de julho de 2013

Formando autômatos

Neste período de férias, observando o dia-a-dia de meu filho de sete anos, percebo o quanto a escola pode ser um espaço opressor, desestimulante, ignorante, pedante e outras mais que sei, podemos incluir aqui.
Meu filho tem uma mudança de humor, de olhar para a vida, de avaliar o seu dia que muda, e muita muito, quando não está na escola.
Todos os dias ele acorda, relaxa e pergunta se pode usar o tablet, o computador ou o videogame, esse último com muito mais frequência.
Me preocupo com o tempo que ele passa nessas atividades, quando poderia brincar com outras crianças, realizar atividades físicas e outras coisas mais. Mas, tenho lido muito sobre os chamados nativos digitais e suas particularidades. Particularidades essas, que devemos buscar conhecer e entender, para não agirmos equivocadamente na educação de nossos filhos.
Na escola, meu filho realiza atividades diversas, entre elas está o futebol, judô, educação física, ginástica olímpica e natação. Acho mais que suficiente para ele. Então, nas férias, acho que ele tem o direito de não querer fazer nada disso, de fazer só o que gosta. Ele tem o direito de deixar as regras, deixar a rotina de lado, viver sua própria rotina, dentro é claro de uma rotina mais flexível, mas existente, no que diz respeito a alimentação, higiene e outras coisinhas a mais que fazem parte do nosso dia-a-dia e que não tiram férias.
Mas, voltando às mudanças do meu filho, percebo a felicidade com que ele me aborda o dia inteiro, para falar de suas descobertas, de suas conquistas. Ele mostra um entusiasmo, quando consegue realizar ou descobrir algo novo, que eu gostaria muito que fosse recíproco quando se fala da escola. Sem contar nos inúmeros abraços e beijos, nos “mamãe eu te amo”, “estou muito feliz”, que completam meus dias.
Essas observações me levam a pensar porque as coisas são como elas são. Pensem na escola como ela é hoje? Como era na sua época?
Eu adorava a escola, adorava mesmo! Adora as tarefas de casa, me sentia importante fazendo-as. Lembro-me de que não era necessário meus pais solicitarem que eu fizesse as tarefas, eu as realizava com o maior prazer e, se tivesse mais, as faria com o mesmo prazer.
Por quê eu adorava a escola? Por quê eu adorava as tarefas de casa? Porque como muitas crianças, tive uma infância simples e sem muitas diversões. Pouquíssimos brinquedos, pouquíssimos canais de TV, poucos passeios e muito tempo livre. Então, a escola era o espaço para encontrar os amigos, descobrir coisas novas, brincar, ocupar este tempo livre.
Atualmente, as crianças iniciam muito novas suas vidas acadêmicas. Algumas, como meu filho, entram na creche com meses e seguem uma rotina cansativa, como a de seus pais, passando o dia inteiro fora de casa. Sei que podem haver discordâncias quando eu falo que iniciam suas vidas acadêmicas, mas uma grande maioria das creches realizam atividades educativas desde cedo. Tenho muitos trabalhinhos de meus filho que foram feitos por ele quando ainda tinha meses de idade. Acrescento isso a sua vida acadêmica.
Os primeiros anos escolares, antes do ensino fundamental, apresentam-se aos alunos de maneira dinâmica, divertida, estimulante. Eles realmente gostam do que fazem, curtem o momento, o aprendizado e mostram-se felizes com seu dia e com suas conquistas. A mudança drástica que ocorre na passagem da Educação Infantil para o Ensino Fundamental causa traumas, assusta, e até mesmo pode levar a criança a olhar a escola como um inimigo.
Sempre questionei o porque dessas mudanças tão drásticas. Por que não conseguimos repetir o sucesso da Educação Infantil no Ensino Fundamental? Aos cinco anos de idade, a criança é “linda”, “fofa”, “criativa”, “dinâmica”... ao completar os seis anos, esta mesma criança, precisa entender, isto é, com a diferença de vinte quatro horas, entre ter cindo anos e ter seis anos, que a vida não é tão simples e colorida como ela pensava. Essa criança, agora com seis anos, precisa entender que a escola não é para brincar, que a grande quantidade de conteúdo a ser trabalhado nos seus anos escolares requer uma postura mais “adulta”, essa criança precisa rapidamente crescer, amadurecer para conseguir acompanhar sua vida acadêmica, agora no Ensino Fundamental.
Menos parquinhos, mais horas em sala de aula, menos pintura, mais treinos de caligrafia, menos interação, mais atenção ao professor.
O pior de tudo é que eu como mãe, sigo o “plano” engendrado pela sociedade e, submeto meu filho a “essa escola”, a “essa sociedade”, onde quanto mais cedo aprender e em maior quantidade, melhor.
Se você comparar o que as crianças aprendem hoje aos sete anos de idade com o que você estava aprendendo nesta mesma idade, verá que elas estão aprendendo muito mais coisas do que você consegue se imaginar capaz. Mas, se elas estão acompanhando, isso é um sinal de que tudo está bem. Isto será importante para o futuro delas. A escola sabe o que faz. Afinal de contas, a escola tem centenas de alunos, e não pode estar tão errada assim. Talvez você é que não entenda todo o processo educacional de hoje.
Me pergunto, com todas as mudanças ocorridas na sociedade, no cotiano de seus cidadãos, onde estão as mudanças na escola? Qual a diferença da sua escola para a escola do seu filho? Como você aprendeu e como ele aprende? Qual a formação de seus professores e qual a formação dos professores de seu filho? Como era o seu livro didático e como é o livro didático do seu filho?
Meu filho tem facilidade em aprender e é muito participativo nas aulas, isso segundo seus professores. Faz muitas perguntas, sempre questiona a fala dos professores e até hoje ainda tem muito frequente o “por que?”. Mas, recusa-se a realizar as tarefas que exigem o registro através da escrita. Quando o professor pede que copie do quadro então, aí é que ele não faz mesmo. Por este motivo, não tira notas muito boas, está sempre pendurado, sempre na média exigida pela escola.
Quando você pergunta o motivo pelo qual ele não quis fazer a tarefa ele fala que “é muito chata”, “já fiz uma igual” ou “não sei fazer”.
Nada de novo que ele aprenda na escola é relatado com tanto entusiasmo quanto quando ele descobre algo nas atividades que ele realiza em casa, principalmente no período de férias.
Aí você poderia dizer que é óbvio que ficar jogando videogame é muito mais prazeroso, utilizar um computador ou um tablet é bem mais legal. Mas, então, porque a escola, que já sabe disso, não inseri esses recursos em seu cotidiano? Recursos esses que fazem parte do dia-a-dia do aluno e que criam uma separação entre a vida social e a vida escolar dele.
Meu filho, quando está interessado em um jogo, não fica “só jogando”. Ele realiza buscas no youtube, para assistir vídeos sobre o jogo, ele acessa fóruns sobre o jogo, lê as dicas e dúvidas dos participantes, comenta, experimenta, testa a informação adquirida e transforma-a em conhecimento. Ele não está apenas repetindo, ele está adaptando, praticando, transformando. Isso, com pouquíssimas ou nenhuma interferência de um adulto. Essas buscas e tentativas ele faz sozinho, e só recorre a um adulto quando não consegue seguir a diante.
Não me intendam mal, não quero dizer com isso, que ele pode fazer tudo sozinho, só quero dizer que depois que lhe dão o caminho, a direção, ele segue sozinho e quando se perde, busca quem pode orientá-lo. É claro que ele precisa de alguém para lhe ensinar a ler, a escrever, a utilizar um site de busca, um fórum, mas quando ele tem a direção ele continua em frente, buscando a informação, construindo o conhecimento próprio.
Não vou nem citar as habilidades desenvolvidas com essas atividades. Muitos adultos, infelizmente, não conseguem desenvolver tais habilidades, não por não terem competências para tal, mas porque são de “outra época”, de “outro momento
“, e não tiveram as orientações certas.
Algumas pessoas, quando falam em videogames parece que estão falando sobre algo inútil, fútil e que estraga as crianças. Não procuram entender e nem conhecer de perto, antes mesmo de julgar. A escola se comporta de maneira muito semelhante, julgam a tecnologia antes mesmo de conhecer, nem sequer tentam usá-la. Acham que só servem para entrenter, divertir, como se no entretenimento, na diversão, não existisse aprendizagem.
Se você está doente e não usa o remédio que o médico lhe receitou, vai continuar doente. Até mesmo piorar. Então para que você vai ao médico?
Se a escola está com problemas e conhece esses problemas, porque não tenta resolver? A sociedade atual, chamada de sociedade digital, já não se encaixa mais nos moldes da educação tradicional, onde a inclusão do quadro negro e até mesmo do livro didático causou desconforto e recusas. A questão está no novo, todos temos medo do novo, não conhecemos, não dominamos não sabemos o que fazer com ele. Principalmente o professor, acostumado a dominar o conhecimento, a ser o detentor deste, fica bem desconfortável com o novo interferindo em sua aula, em seu espaço, em seu domínio.
Mas, já se passaram mais de quatro décadas, desde que se iniciou as discussões sobre a introdução das novas tecnologias no ambiente escolar. Não podemos mais dizer que é novo, e por isso assusta. Deixemos de usar as mesmas descultas de quarenta anos atrás e façamos o que tem que ser feito. A escola precisa urgentemente entender que para fazer parte desta sociedade digital, ela precisa aceitar as mudanças no seu espaço físico e principalmente em seus alunos, que já não querem mais aprender somente com um livro e com o professor. Querem ampliar horizontes, querem explorar outras fontes, outras mídias e principalmente, querem interagir, participar, construir junto, e não receber pronto.
Precisamos deixar de formar autômatos, precisamos deixar que eles desenvolvam habilidades necessárias a esse novo mundo. Precisamos deixar de nos preocupar com a bela caligrafia, com o algorítmo imposto, e nos preocupar mais com as competências a serem desenvolvidas para viverem e sobreviverem nesta nova sociedade. Competências essas que me parecem, eles desenvolvem melhor fora da escola, agindo como cidadãos que são, pertencentes à sociedade digital, mergulhados na cibercultura, criando e recriando o conhecimento, buscando a informação, interagindo, compartilhando, socializando.
 Não acredito que meu filho não goste de aprender, não goste da escola. Acredito mais, que ele não reconheça a escola como um espaço para aprender. Aprender no sentido do nativo digital, aprender dinâmicamente, interagindo, buscando, construindo, reconstruindo, tornado-se ativo no processo ensino-aprendizagem e não mais um autômato recebendo os comandos que deverá executar. Isso não é aprender. Ele realmente não nasceu para autômato e por isso não se encaixa no sistema de ensino atual.

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